Há alguns anos, ouvi de um amigo algo que nunca mais consegui esquecer:
— Você tem uma força sobrenatural — ele me disse, enquanto eu lamentava uma situação muito difícil pela qual estava passando.
Meu desabafo acontecia em um momento de extremo cansaço, durante uma estação de problemas recorrentes. Minha expectativa naquela conversa era receber consolo ou, quem sabe, um gesto de apoio. Mas meu amigo me ofereceu um lembrete que soou alarmante e não teve o efeito pretendido.
Não demonstrei na hora, mas aquelas palavras me deixaram profundamente irritado. Não porque eu não entendesse suas intenções ou o que ele estava tentando me comunicar, mas porque, naquele momento, suas palavras não pareciam verdadeiras na minha realidade presente.
Eu não me sentia forte, tampouco sobrenatural.
O que meu amigo queria me lembrar era que eu já havia enfrentado situações muito piores antes, desafios ainda maiores, e saí vencedor de todas elas. O problema era que, naquele momento, eu não queria mais lutar. Eu não queria mais ser forte.
A ideia de que eu tinha algum “superpoder” para vencer mais uma batalha gerou em mim uma reação automática de basta! Eu não queria mais uma vitória para virar testemunho. Eu só queria conforto e descanso.
A verdade é que aquelas palavras me atravessaram de um jeito estranho, deixando um “gosto amargo” na boca. Nos dias que se seguiram, pensei nelas constantemente. Não sei explicar o motivo, mas às vezes sou assim: meu pensamento se torna obsessivo até eu decifrar a raiz do incômodo.
Acredito que ouvir que eu possuía uma “força sobrenatural” em um momento de humana fraqueza fez com que eu me sentisse, de certa forma, injustiçado. Era como se afirmassem que eu havia sido “escolhido” para sofrer e que, no fim, tudo ficaria bem — bastava aguentar firme.
Mas algumas verdades são muito diferentes na teoria e na prática.
É um conceito lindo acreditar que, com Deus, podemos passar pelo fogo sem sermos queimados ou pelas águas sem nos afogarmos. Mas você já tentou sair de uma casa em chamas? Já nadou contra a correnteza do mar enquanto ele tenta te tragar?
As cicatrizes das batalhas podem dar à aparência de algumas pessoas um ar heróico, mas antes de se tornarem cicatrizes, existiram feridas abertas e muita dor no processo de cura. Recentemente, assisti ao novo filme do Super-Homem e fui lembrado da frase do meu amigo: até mesmo um super-herói tem momentos de fraqueza e vulnerabilidade.
Quando você está perdendo uma batalha importante, o histórico de vitórias passadas não é suficiente para impedir o medo de fracassar ou o pensamento de que você não vai aguentar.
Eu sou um sobrevivente, não porque escolhi ser, mas porque a vida me aconteceu assim. Precisei encarar os monstros do abuso e da violência quando era apenas uma criança. Lutei contra gigantes quando ainda era muito jovem. Superei barreiras de preconceito e saltei abismos de desigualdade para alcançar um futuro promissor. Mas não há nada de “super” ou heróico em mim.
Perdi a conta de quantas vezes ouvi pessoas admirarem minha coragem, mas só eu sei o medo que sinto a cada nova aventura que Deus coloca na próxima esquina do meu caminho.
A ideia de uma “força sobrenatural” me pareceu tão inadequada naquele dia porque eu estava olhando para mim mesmo. Eu nunca me senti “super”. Naquele momento, eu estava particularmente fraco — a ponto de querer desistir de tudo.
Levaram anos para que eu fosse suficientemente curado para entender que eu não precisava ser forte o tempo todo, nem precisava ser forte por mim mesmo. Hoje, compreendo que de fato possuo uma força sobrenatural, mas a fonte dessa força não está em mim. Vem de Deus, do seu Espírito que nos capacita.
O mesmo Espírito que fortaleceu Jesus antes da cruz e o ressuscitou dentre os mortos. O mesmo Espírito que encheu Pedro de coragem para pregar o evangelho após o Pentecostes, que fortaleceu Estevão enquanto enfrentava o martírio, e que capacitou Paulo a suportar tantos sofrimentos com contentamento.
Tenho aprendido a depender desse Espírito e a reconhecer a fragilidade e a limitação da minha humanidade. A mesma pessoa que, às vezes, entrega uma performance brilhante, também lida com crises de ansiedade e episódios de depressão. O mesmo Diego que venceu tantas adversidades, às vezes chora de frustração quando algo simples dá errado ou quando um plano fracassa.
Durante anos, fui um “super-homem” no exercício do ministério. Fui pastor de jovens, depois pastor sênior. Liderava reuniões, aconselhava dezenas de pessoas por semana, pregava inúmeros sermões, organizava eventos, gerenciava orçamentos, escrevia materiais teológicos e ainda escolhia campanhas de marketing. Fico cansado só de lembrar!
Fiz um excelente trabalho durante seis anos seguidos, até que meu corpo me cobrou a fatura e minha mente me mandou um alerta vermelho: era hora de desacelerar. O nome técnico para isso é “burnout”. Precisei reaprender a descansar. Vivi um ano sabático, que culminou na minha mudança para a Nova Zelândia.
Nesse sabático, aprendi que havia internalizado um “complexo de salvador” — eu acreditava ser o responsável por consertar tudo e salvar a todos. Se eu não estivesse constantemente sobrecarregado, não era produtivo. Pior: eu acreditava que, se não me responsabilizasse por tudo e todos, eu não tinha valor.
Entendi que, por causa das lutas precoces da minha vida, minha identidade foi moldada em torno de uma noção distorcida de resiliência, que glorificava o sofrimento e justificava abusos. Eu era o “melhor pastor do mundo” porque carregava fardos extras, tornando a caminhada dos outros mais leve.
Mas Jesus precisou me lembrar que o fardo dele é leve e o jugo é suave. Precisei aprender a dizer “não” e a estabelecer limites claros. Desagradei pessoas, perdi alguns relacionamentos e precisei me acostumar a caminhar de uma forma nova, mesmo quando as pessoas não me reconheciam mais. Foi um processo doloroso, mas que trouxe uma cura profunda e duradoura à minha identidade e ao meu bem-estar. Foi um processo libertador.
Hoje, estou aprendendo, dia após dia, a caminhar mais leve. A ser intencional no que faço, criterioso nas minhas escolhas e compromissos. Estou aprendendo a não negociar meu descanso, a desligar o telefone quando necessário e a caminhar consciente da minha humanidade.
Tenho descoberto que meu maior “superpoder” é, na verdade, a minha humanidade. Minha fragilidade, incapacidade e inadequação são a matéria-prima para que o poder de Deus se manifeste de forma visível, de modo que toda a glória seja dele, e não minha.
Quero aprender a caminhar leve. A me alegrar em ser o “número dois”. A descobrir o segredo da humildade de Jesus, contentando-me em ver outros serem protagonistas, intencionalmente diminuindo para que Ele cresça.
Esse é o novo alvo.
Essa é a minha “super-missão”.